24 de setembro de 2025

Análises

O senso comum anti-clima

Como um novo senso comum climático foi construído e como o ataque de Trump ameaça desfazê-lo

As condições que levaram os Democratas a priorizar uma ação climática ousada em 2021 já vinham se deteriorando antes mesmo da eleição de Donald Trump, e a ofensiva atual anti-clima corre o risco de provocar um desmantelamento completo. Ao longo da década de 2010 e mesmo no início dos anos 2020, os defensores do clima conseguiram conectar crenças sobre o futuro com a formação de coalizões, as quais tornaram a ação climática uma prioridade inevitável para o governo dos Estados Unidos. Um novo senso comum havia sido construído em torno de um único pressuposto: o de que o futuro envolve restrições às emissões de carbono. Este pressuposto uniu um vasto, porém frágil, ecossistema de interesses, por vezes concorrentes em torno do imperativo de responder com a descarbonização de toda a economia.

Desde 2023, no entanto, tem crescido o ceticismo em relação ao cronograma em que as restrições ao carbono passarão a ser realmente vinculantes. Também aumentou a desconfiança em relação à capacidade da ação climática de trazer benefícios concretos para grupos de apoio eleitoral. Em todas as suas formas, os ataques de Trump buscam convencer os estadunidenses de que a ação climática os deixará em pior situação. Assim, desmontam as coalizões cuidadosamente construídas que a tornaram possível nos Estados Unidos. O enfraquecimento da confiança e das bases sociais da coalizão pró-clima já está desacelerando o ritmo da descarbonização. O que está em risco é o estabelecimento de ciclos de retroalimentação negativa, que distorcerão os incentivos e reforçarão a demora e a inação.

Encontrar outro caminho requer compreender como o consenso em torno da ação climática foi construído—e como tanto as coalizões de interesse quanto a crença em um futuro com restrições ao carbono estão sendo desmanteladas pela produção de um senso comum anti-clima.

Criando o novo senso comum climático

Desde o Acordo de Paris de 2015 e o relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) de 2018, que previu consequências desastrosas caso o aquecimento global ultrapassasse 1,5 °C, os defensores da ação climática passaram a moldar uma compreensão de futuro capaz de reorganizar os interesses próprios dos atores em cena. Entre os parâmetros desse futuro imaginado estão: o aquecimento global é real e de origem antropogênica; à medida que as emissões se acumulam e as temperaturas aumentam, os sistemas ecológicos e econômicos se desestabilizam, prenunciando um futuro consideravelmente pior para a civilização humana; e a perspectiva desse futuro—além dos sinais crescentes no presente—acabará por forçar os governos a agir para restringir as emissões de carbono. Em outras palavras, o futuro envolve restrições ao carbono. Podemos chamar isso de Novo Senso Comum Climático (NSCC).

A estratégia e a solução que derivam do NSCC são a descarbonização rápida. A transição para uma economia de baixo carbono interessa a quase todo mundo, pois os custos com mitigação e adaptação aumentam com o atraso, e o risco de os ativos tornarem-se obsoletos ameaça tanto as finanças públicas quanto as privadas. Os primeiros a agir em direção a um sistema pós-carbono terão vantagem em um mundo com restrições às emissões, e as perspectivas de vida seriam imensamente melhoradas com um sistema climático mais estável. Enquanto o consenso anterior, na comunidade climática, entendia o problema principalmente como uma questão de ação coletiva, o novo senso comum propôs uma teoria de competição entre formuladores de políticas, empresas e países—todos buscando ser os primeiros a encontrar soluções para o futuro pós-carbono.

A consolidação dessa visão nos centros de poder das elites se espalhou rapidamente em meados da última década. Nos mais altos níveis de coordenação—conselhos corporativos, organizações multilaterais, governos nacionais e subnacionais—, o novo senso comum se traduziu em novas formas de compromisso e, em alguns casos, em ação concreta. O compromisso de atingir emissões líquidas zero proliferou nos setores corporativo e financeiro, seguindo as Contribuições Nacionalmente Determinadas (em inglês NDCs) estabelecidas pelo Acordo de Paris. Surgiram ideias para redirecionar o poder financeiro em favor de atividades de baixo carbono, como o movimento ESG (Environmental, Social, and Governance, ou seja, compromisso com as questões ambiental, social e de governança) e a Aliança Financeira de Glasgow para o Net Zero (em inglês GFANZ). Os governos adotaram políticas para impulsionar a transição energética, incluindo subsídios para energias renováveis e mercados de carbono, dentre outras medidas, que funcionaram como catalisadoras de novas ações corporativas e governamentais e como apostas de que a liderança inicial abriria o caminho para novos seguidores.

Traduzir o NSCC em ação climática concreta exigiu que se vencesse uma disputa política contra todos os interesses contrários à descarbonização—cujo núcleo consiste em poderosos modelos de negócio baseados em energia e produção com uso intensivo de carbono. Dessa luta surgiu uma nova onda de estratégias, fundamentadas no objetivo de construir uma coalizão forte o suficiente para superar o poder político desse bloco do carbono. Entre diversos agentes, a estratégia que emergiu foi a de apontar para os benefícios mútuos—ou seja, criar alinhamentos entre múltiplos grupos de interesse, capazes de perseguir diferentes objetivos por meio da descarbonização. Assim, movimentos sociais, líderes empresariais e formuladores de políticas agindo em nome do interesse nacional encontraram pontos de convergência.

Os movimentos sociais de jovens—sobretudo o Fridays For Future e o Sunrise Movement—conquistaram enorme atenção da mídia ao focarem diretamente na questão de seus próprios futuros. Novos grupos trabalhistas e climáticos passaram a promover políticas e formas de organização voltadas a proteger os trabalhadores afetados pela descarbonização da indústria—a chamada transição justa—e a organizar trabalhadores em setores de baixo carbono. Os ativistas do Green New Deal direcionaram o discurso e as demandas do movimento para uma visão de renovação social, na qual as lutas geracionais contra a desigualdade de renda e a estratificação racial poderiam se fundir à batalha existencial contra o colapso climático.

Os interesses do mundo corporativo foram moldados por formuladores de políticas e pelo ativismo corporativo. As organizações que possuíam alguns ativos de carbono e que poderiam, de forma plausível, tornar-se verdes—como as concessionárias de energia elétrica e a indústria automotiva—, receberiam “acordos de descarbonização”, sob a forma de subsídios, mercados garantidos e outros incentivos. Agindo de acordo com o novo senso comum, que apontava para um futuro inevitável de desenvolvimento tecnológico, aumento da demanda dos consumidores e regulação governamental, essas empresas aceitariam os acordos propostos.

Enquanto isso, as gigantes multinacionais da indústria de petróleo e gás começaram—ainda que de maneira duvidosa—a apostar na passagem dos combustíveis fósseis para as tecnologias de transição, como captura de carbono, hidrogênio e outras.

Ao mesmo tempo, a queda dos custos das energias renováveis—o custo nivelado da energia solar caiu pela metade entre 2010 e 2015, e novamente entre 2015 e 2020—incentivou sua adoção e reforçou o senso comum de que a transição tinha menos a ver com sacrifícios e mais com uma disputa sobre quem colheria os benefícios de uma inevitável era com energia abundante e acessível. A ação climática passou a ser vista, cada vez mais, como o prenúncio de um boom de investimentos.

Enquanto isso, as elites da política externa do Partido Democrata—que absorveram o impacto da rejeição eleitoral ao establishment liberal após a vitória de Trump em 2016—passaram a ver o tema climático como parte central de uma estratégia de renovação do liberalismo. O país líder em tecnologia no mundo, maior emissor histórico de carbono e mais poderoso do planeta poderia estimular outros a agir e fornecer a tecnologia e o financiamento necessários para viabilizar a transição. Ao chegarem à conclusão de que a mudança climática representava o maior desafio global, mas também uma oportunidade para os Estados Unidos demonstrarem uma liderança construtiva no cenário internacional e se posicionarem na vanguarda de uma nova revolução tecnológica, os membros desse grupo passaram a associar o investimento público em ação climática a uma ofensiva contra a desigualdade econômica interna, voltada a reverter os danos econômicos e políticos da desindustrialização.

Vale destacar que, em um ensaio programático publicado em fevereiro de 2020 sobre esse tema, Jake Sullivan e Jennifer Harris argumentaram que uma transformação na formulação de políticas econômicas nacionais era central para o sucesso da política externa dos Estados Unidos—tendo a ação climática como elo-chave entre as duas esferas.

A teoria das coalizões gerou ciclos de retroalimentação positiva. A redução do custo da transição de modelos de negócios e econômicos baseados em carbono para modelos não baseados em carbono, os benefícios sociais que tornam a ação climática popular do ponto de vista eleitoral, e o convencimento dos agentes de que o futuro de fato envolverá restrições ao carbono criaram incentivos adicionais para a ação antecipada. Cada passo dado em resposta reforçava a crença de que o futuro seria de baixo carbono e aumentava a percepção dos custos da inação.

Essa teoria da mudança contribuiu para a importância sem precedentes do tema climático nas eleições de 2020. Já no início das primárias de 2019, esse senso comum havia se tornado hegemônico dentro do Partido Democrata, a ponto de um dos principais temas de debate entre os candidatos presidenciais ser o grau de agressividade com que deveriam combater as mudanças climáticas.

Senso comum e consenso

O novo senso comum definiu como imperativa a descarbonização e apresentou uma teoria de transformação baseada em co-benefícios. Em um nível mais fundamental, o consentimento e a ação dos detentores de poder baseavam-se no reconhecimento de três macrotendências: a ascensão da China como potência econômica e tecnológica; as perturbações econômicas e políticas nas economias avançadas desde a Grande Crise Financeira de 2008; e a inevitabilidade das mudanças climáticas.

Todos esses fenômenos interagiam e se moldavam mutuamente. Por exemplo, o chamado “choque da China” foi responsabilizado pela desindustrialização e pelo surgimento do populismo entre os operários industriais. Já a ação climática passou a ser vista, por um lado, como um campo possível de cooperação entre Estados Unidos e China ou, cada vez mais, como uma área em que a necessidade de competir com a China se tornava uma razão para priorizar a política climática.

Essas tendências lançaram as bases para a ruptura da ortodoxia econômica entre os principais Democratas. A ideia de que a disciplina fiscal havia prejudicado suas perspectivas políticas—em especial, de que a resposta fiscal limitada à crise de 2008 contribuíra para a eleição de Trump—foi amplamente difundida.

Impulsionados, curiosamente, pela reintrodução feita por  Larry Summers, em 2013, da ideia keynesiana de “estagnação secular”, e pela ausência de qualquer sinal de inflação em resposta à política fiscal expansionista do primeiro mandato de Trump, os Democratas começaram a se perguntar se não fora exagero o temor das lições da década de 1970.

A radicalização do Partido Republicano—e a ascensão de Bernie Sanders e de uma ala “populista” entre os Democratas—sugeria que o bipartidarismo morno e o teorema do eleitor mediano já não garantiam vitórias políticas. Além disso, o extraordinário desenvolvimento econômico da China despertou um sentimento de pânico competitivo e renovou o interesse por política industrial—que, à luz do fracasso anterior do sistema de precificação de carbono, passou a ser vista como um vetor central da ação climática.

A crise da COVID-19 gerou um novo senso de urgência e de possibilidades. Os gargalos nas cadeias de suprimentos e a súbita visibilidade das redes globais de produção reforçaram os argumentos em favor da política industrial e da resiliência econômica doméstica.

A resposta à depressão econômica causada pela pandemia tornou comuns os apelos por um estímulo fiscal maciço—e reavivou a possibilidade política de ampliar os gastos públicos voltados a diversas necessidades sociais.

Em seguida, o ataque ao Capitólio de 6 de janeiro de 2021 convenceu temporariamente os Democratas de que eles podiam—e deviam—agir de forma partidária para enfrentar as crises do momento: pandemia, clima, desigualdade e justiça racial, conforme destacado no discurso de posse de Joe Biden.

Nos primeiros dias do governo Biden, os líderes do Partido Democrata estavam convencidos de que algo como uma “política industrial verde”—com dispositivos para proteção ao trabalho e para justiça ambiental, acompanhados de uma expansão importante do Estado de bem-estar social—seria a bala de prata para enfrentar um conjunto de crises que iam muito além das mudanças climáticas.

Refletindo os anseios dos diferentes segmentos da coalizão, acreditava-se que uma política fiscal verde e robusta poderia revigorar a economia estadunidense, reduzir a desigualdade, promover a equidade racial e reforçar a democracia.

A trajetória que vai do American Jobs Plan ao Build Back Better e, depois, ao Inflation Reduction Act (IRA) já é bem conhecida. Mas vale repetir que a magnitude e a quantidade de crises que os Democratas acreditavam poder enfrentar por meio da ação climática—impulsionados pelo forte alinhamento em torno do NSCC—os levaram a priorizar o clima acima de praticamente todas as outras pautas quando as ambições iniciais foram limitadas por Manchin e Sinema, no final de 2021.

Governando com o senso comum

O desenho do IRA refletia a lógica do novo senso comum climático. As intervenções foram desenvolvidas de modo a se alinhar às metas do Acordo de Paris—especialmente os créditos fiscais para eletricidade limpa, neutros em relação à tecnologia, definidos para durar até que as emissões caíssem 75% em relação aos níveis de 2022.

O governo assumiu um papel central no planejamento de financiamentos, tecnologias e investimentos em infraestrutura—por meio de créditos fiscais (sem limite máximo) ao investimento e à produção e da grande ampliação da autoridade do Departamento de Energia para a concessão de empréstimos—, com o objetivo de direcionar a transformação de todo o sistema energético dos Estados Unidos.

Bônus salariais e de aprendizagem foram vinculados aos créditos fiscais do IRA, incorporando pela primeira vez padrões trabalhistas ao código tributário e associando-os ao investimento de baixo carbono. Foram oferecidos “acordos de descarbonização” não apenas para os setores automotivo e elétrico, mas também para a indústria e a agricultura—neutralizando parte da oposição proveniente desses setores.

O IRA também promoveu a indústria nacional e a ideia de segurança empresarial de longo prazo, sustentada pela convicção de que estavam sendo feitos investimentos duradouros para enfrentar o problema climático.

Essas políticas tinham por objetivo consolidar uma economia resistente à reversão das mudanças climáticas. O núcleo duro da coalizão do carbono recebeu a maior parte dos novos fluxos de investimento, baseando-se na convicção de que futuros congressos e governos Republicanos dificilmente revogariam medidas que estivessem gerando investimentos e empregos em seus distritos.

Os impactos iniciais foram consideráveis: o capital de fato parecia estar sendo atraído para os setores de energia limpa e a adesão aos subsídios superou as estimativas do Escritório de Orçamento do Congresso, sugerindo que, apesar dos esforços de Manchin, a “grande política fiscal verde” estava realmente ganhando força.

Combinado às ações regulatórias estaduais e federais que sinalizavam um novo impulso à descarbonização após os subsídios do IRA, o NSCC foi reafirmado e fortalecido—e os ciclos de retroalimentação positiva pareciam prestes a se concretizar.

O novo golpe verde

A direita e a alta roda do bloco do carbono direcionaram seus ataques ao novo senso comum climático. Campanhas poderosas e de caráter puramente ideológico se multiplicaram. O impulso foi especialmente forte nos estados controlados por Republicanos, onde houve anulação de leis locais sobre questões climáticas e boicotes a agentes do setor privado, retratados como representantes da frente do “capital woke”, acusados de discriminar seus estados. Ao mesmo tempo, campanhas de desinformação na base buscavam desacreditar toda a agenda climática. Com terreno fértil na guerra cultural, a direita passou a enquadrar a ação climática como um exercício de engenharia social coercitiva promovido por “lunáticos da esquerda radical” que odeiam os Estados Unidos.

Entre os Democratas, desdobramentos que se notaram ainda 2022 puseram em dúvida se a descarbonização era realmente o sucesso econômico, político e geopolítico que parecia ser em 2021. O primeiro desconforto surgiu em resposta à invasão da Ucrânia pela Rússia, quando a redução dos preços de energia se tornou uma prioridade política nacional e o gás natural liquefeito (GNL) dos EUA passou a ser visto por muitos como uma fonte de poder e prosperidade no cenário mundial.

O pleno emprego, a inflação mais alta em quarenta anos e o fim da política de juros zero do Federal Reserve enfraqueceram algumas das justificativas para uma política fiscal verde de grandes proporções, especialmente pela forma como o eleitorado passou a priorizar, entre suas principais preocupações, a criação de empregos em relação ao custo de vida.

A explosão da Inteligência Artificial (IA) generativa no final de 2023 transformou completamente a percepção sobre o que seria necessário para descarbonizar a rede elétrica. Em conjunto com a crescente ansiedade em relação à competição com a China, a IA passou a ser usada como argumento em favor de um “realismo” quanto ao ritmo da descarbonização. O sucesso da BYD destacou o crescente abismo entre os Estados Unidos e a China em tecnologias limpas e alimentou temores de um “segundo choque da China”, desta vez diretamente associado à descarbonização.

Enquanto isso, aumentavam as dúvidas sobre se os prometidos co-benefícios gerados pela ação climática estavam realmente se concretizando. O governo falava constantemente em “bons empregos sindicalizados”, mas, na prática, relativamente poucos empregos industriais caminhavam para se tornar de fato sindicalizados.

Comentaristas e partidários do plano começaram a questionar se questões de procedimento e os esforços para vincular benefícios locais diretos aos projetos estariam desacelerando o ritmo dos investimentos e, consequentemente, o cronograma ao longo do qual um conjunto mais amplo de pessoas experimentaria os benefícios colaterais da ação climática.

Se Kamala Harris tivesse derrotado Trump, essas questões provavelmente teriam definido o terreno da política climática durante seu governo. Com a vitória do último, porém, elas se tornaram as fissuras que a nova administração buscaria explorar na tentativa de desfazer o que os defensores do clima, o governo Biden e os Democratas no Congresso haviam conquistado.

A campanha presidencial de Trump em 2024 fez do “Green New Scam” (Golpe do Novo Acordo Verde) um tema central. Quando Trump e o Partido Republicano conquistaram a Casa Branca e o Congresso, ficou claro que haveria confrontos e reversões. Mas havia contraposições já consolidadas pelo IRA: centenas de bilhões de dólares em investimentos e centenas de milhares de empregos, localizados predominantemente em distritos Republicanos e dependentes dos créditos fiscais do IRA. O boom da IA estava explodindo a demanda por eletricidade—cortar os créditos fiscais de energia limpa aumentaria o preço da energia precisamente no momento em que empresas poderosas e pessoas comuns a demandavam abundante e barata. E o compromisso bipartidário com a competição com a China demandaria apoio governamental às empresas potencialmente concorrentes nos EUA.

Até agora, nada disso impediu que o governo Trump cancelasse unilateralmente centenas de contratos de subsídios vinculados aos programas do IRA, em linha com as ordens executivas iniciais direcionadas aos projetos do governo Biden que focavam em diversidade, equidade e inclusão. Os créditos fiscais do IRA—de longe a maior bala na agulha das políticas fiscais verdes—ficaram presos na disputa sobre a renovação dos cortes de impostos de Trump de 2017. 

Mais de duas dúzias de membros Republicanos do Congresso articularam publicamente o desejo de manter a maioria ou todos os créditos fiscais em vigor. A oposição ao corte dos créditos foi apoiada por grandes lobbies empresariais, sindicatos e funcionários locais, dentre outros. No entanto, a combinação de linha-dura fiscal conservadora (incentivada por grupos como o House Freedom Caucus), a própria animosidade pessoal de Trump, a inclusão de medidas como as isenções fiscais para os mais ricos, e o controle férreo de Trump sobre todo o Partido Republicano levaram todos a ceder e votar em um projeto que os atinge amplamente, pela perda dos créditos e prejuízo econômico real aos trabalhadores e empresas em seus distritos.

A destruição do senso comum

A partir das últimas semanas da disputa em relação à Lei “One Big Beautiful Bill” (OBBB), quando congressistas linha-dura como Chip Roy se uniram a charlatões como Alex Epstein para montar um ataque total às energias renováveis, o antigo consenso energético do Partido Republicano foi substituído por um ataque frontal a tudo que se relacionasse ao clima, incluindo uma política de discriminação ativa contra a energia solar e eólica. 

Apoiada pelo Secretário de Energia Chris Wright, a posição espúria, porém oficial, do governo Trump agora é que a energia solar e a eólica prejudicam ativamente a rede elétrica ao exigir investimentos caros em transmissão e energia de reserva. Além disso, argumenta-se que a implantação de energia limpa favorece o domínio setorial da China, enfraquecendo a posição dos EUA. Em um movimento que se assemelha a uma versão distópica do ativismo anti-oleodutos, o governo Trump revogou licenças de projetos eólicos offshore que estavam 80% completos.

Poucas contrapressões significativas existem atualmente. A ampla coalizão envolvendo sociedade civil, setores importantes do capital e Partido Democrata, que se uniram para promulgar um programa de larga escala de apoio público à descarbonização, tem sido, até o momento, incapaz de montar uma resposta eficaz a esse ataque. Parte dessa falha em se mobilizar reflete o medo agudo que Trump instilou em todos os tipos de atores poderosos, talvez especialmente—e, o que é mais chocante, considerando que ainda estamos falando dos Estados Unidos da América—nos líderes das principais corporações americanas e multinacionais. 

Parte disso reflete uma mudança de prioridades entre alguns atores que anteriormente eram pilares da coalizão. As big techs, para tomar um exemplo importante, ainda certamente prefeririam apoio federal para energia limpa mais barata. Mas os compromissos para zero emissões líquidas das empresas do Vale do Silício já estavam criando desafios à medida que o boom da IA disparou para a estratosfera a demanda por eletricidade. 

Como essas empresas enfrentam uma competição cada vez mais intensa com companhias chinesas, elas estão ansiosas por permanecer nas boas graças da Casa Branca e não veem nenhuma alternativa ao aumento do consumo de eletricidade baseada em carbono, com a demanda total por eletricidade aumentando impressionantes 25% a cada ano. O NSCC fica inevitavelmente enfraquecido quando até mesmo aqueles setores do capital aparentemente mais favoráveis a uma economia pós-carbono demonstram, com decisões de investimento e aquisição, que o ritmo da descarbonização dificilmente corresponderá às metas anteriores.

Em um nível mais profundo, as ações tomadas por Trump e pelo Partido Republicano parecem calibradas precisamente para obliterar o NSCC. O governo agora afirma com confiança e orgulho que os EUA não se descarbonizarão. Empresas, estados e localidades norte-americanas, bem como governos estrangeiros, enfrentam discriminação aberta e economicamente prejudicial se sua atitude em relação ao carbono divergir da visão da Casa Branca. Como isso poderia deixar de convencer muitos atores nos EUA e alhures de que, para dizer o mínimo, o ritmo da descarbonização americana será muito, muito mais lento do que se acreditava há apenas poucos anos? 

Confrontados com essa transformação nas perspectivas em relação a quão cedo o carbono deverá ser restringido, é apenas de se esperar que muitos atores se protejam. Nisto reside um enfraquecimento grave da coalizão climática e, consequentemente, do NSCC.

Vaivém da ação climática

Na situação atual, veremos em todos os setores taxas mais lentas de descarbonização do que teríamos em um mundo onde o status quo político de 2024 permanecesse em vigor. Já estamos vendo projetos cancelados—como a fábrica de baterias e hidrogênio da empresa australiana Fortescue que seria instalada nas imponentes ruínas da planta Fisher Body em Detroit—e certamente há mais por vir. Haverá menos empregos em energia limpa e, muito provavelmente, preços de eletricidade mais altos.

O retrocesso dos créditos fiscais do IRA significa que todos devem considerar a probabilidade de haver oscilações bruscas, minando os ciclos de retroalimentação que consolidaram o novo consenso. Encolhidos, os mercados nacionais para tecnologia de baixo carbono tornarão mais difícil para as empresas liderarem em setores-chave. E aquelas que estavam buscando acordos cautelosos de descarbonização se protegerão ainda mais, especialmente em um ambiente político de discriminação incansável contra a energia limpa. Além disso, empresas em setores descarbonizáveis podem decidir apostar totalmente em um futuro sem restrições de carbono—particularmente aquelas que não buscam vendas fora do mercado dos EUA.

No âmbito estadual, a década de 2010 viu a ação climática contribuir para ciclos de retroalimentação política positivos. Mas o recuo do apoio federal à descarbonização exacerbará as pressões existentes para o retrocesso das metas climáticas. A retirada dos créditos fiscais levará as concessionárias de energia a demandar planos integrados de recursos menos ambiciosos, o que aumentará a pressão sobre os estados para flexibilizar as determinações. Cortes catastróficos da OBBB, com foco no Medicaid e no SNAP [Supplemental Nutrition Assistance Program – Programa de assistência alimentar], provavelmente receberão mais atenção dos legisladores estaduais Democratas do que a tentativa de preencher lacunas no financiamento federal de energia limpa. Assim como uma política estadual ambiciosa ajudou a construir o novo senso comum climático, um recuo, se acontecer, o enfraquecerá.

Outras espirais negativas podem estar à espreita. Por exemplo, formuladores de políticas climáticas têm cada vez mais buscado usar o fator de emissão de carbono no comércio internacional como forma de fornecer incentivos para a descarbonização. O CBAM [Carbon Border Adjustment Mechanism—Mecanismo de Ajuste de Carbono na Fronteira] da Europa—programado para impor uma taxa sobre o fator de emissão das importações para igualar os custos que os produtores europeus devem pagar pelos certificados de emissões sob seu Sistema de Comércio de Emissões—é frequentemente citado como uma razão pela qual a descarbonização interessa às empresas estadunidenses.

Nas recentes “negociações” comerciais entre EUA-União Europeia, o primeiro pressionou por isenções do CBAM para produtores norte-americanos e parece ter conquistado pelo menos uma concessão retórica. Em vez de utilizar o comércio como um vetor para avançar a descarbonização, o governo Trump está transformando o comércio em arma contra a descarbonização. As fortunas dos produtores de combustíveis fósseis dos EUA já têm sido ampliadas por Trump, que está forçando a compra de energia em acordos comerciais com o Japão e a UE.

O IRA foi promulgado logo após o pico do rompimento dos Democratas com a ortodoxia fiscal. A ideia de usar o poder de fogo fiscal do governo federal para uma ação climática agressiva era um ponto de consenso notável. Mesmo antes da promulgação da OBBB, taxas de juros mais altas vinham tornando impossível ignorar o custo fiscal de déficits orçamentários anuais de 6% do PIB. A OBBB certamente agravará esse quadro fiscal, garantindo taxas de juros mais altas no futuro e uma enorme pressão por consolidação fiscal em qualquer eventual governo dos Democratas (e em um Congresso dominado por eles). Empregar poder de fogo fiscal para descarbonização provavelmente será uma ideia mais difícil de vender em 2029 do que foi em 2021. Aqueles que precisam fazer apostas agora sobre a direção futura das políticas levarão isso em conta.

Mesmo antes da aprovação da OBBB, partes do establishment da política externa Democrata questionavam se o poder dos EUA seria realmente beneficiado pela descarbonização. Varun Sivaram, que trabalhou sob o enviado climático John Kerry e, mais recentemente, atuava nas relações governamentais da gigante dinamarquesa de energia eólica offshore Ørsted, escreveu um artigo marcante na Foreign Affairs chamado “Realismo Climático” e foi citado no NY Times dizendo: “A transição energética é na verdade muito ruim para os Estados Unidos, porque cedemos terreno geopolítico e econômico para um rival na China.” A saída do establishment da política externa da coalizão de defesa climática pode significar um compromisso mais fraco com a descarbonização em um futuro governo Democrata e poderia corroer ainda mais o NSCC.

Tudo isso está acontecendo à medida que o governo Trump destrói a credibilidade dos Estados Unidos como um parceiro com o qual empresas, países ou mesmo o Congresso dos EUA podem firmar acordos confiáveis. O dano causado pela governança por extorsão do governo Trump provavelmente será duradouro, porque, tendo elegido Trump não uma, mas duas vezes, não há quem possa prometer de forma crível a quaisquer parceiros que uma futura administração não fará exatamente o mesmo novamente.

Setores descarbonizáveis querem que o governo pague o máximo possível por sua descarbonização. Mas o processo nunca deixa de ter custos para as empresas. Elas querem fazer parceria com o governo dos EUA porque os termos são atraentes e por causa do NSCC—elas veem a descarbonização como sendo algo de seu próprio interesse a longo prazo, um fruto de esclarecimento. Mas o que acontece quando o governo dos EUA começa não apenas a oscilar bruscamente em sua política, mas a cancelar diretamente acordos de compartilhamento de custos? Essas empresas gostariam de fazer parceria com o governo dos EUA no futuro? Que nível de subsídio e extensão de garantia elas exigiriam para sua participação, já que, novamente, os EUA como um todo não podem prometer que não serão eleitos presidentes semelhantes a Trump no futuro? Nosso sistema político apoiaria os termos que elas poderiam exigir? Mesmo que de alguma forma o NSCC não estivesse sendo corroído, a erosão da credibilidade dos EUA por Trump em relação aos nossos próprios capitalistas aumentará o preço de futuros acordos de descarbonização, já mais caros devido a restrições fiscais, redução de mercados e tempo perdido. Acordos mais caros significam menos acordos, alcançando menos descarbonização. Esta é mais uma maneira pela qual o NSCC se corrói.

Terreno acidentado

Os três anos desde 2022 serviram para enfraquecer as crenças em relação às restrições ao carbono no futuro e, em consequência, em relação a quão rapidamente a descarbonização avançará. Para algumas empresas e formuladores de políticas, o risco de ficar para trás em um mundo limitado em carbono agora é sopesado com os riscos de sair perdendo em um mundo que se descarboniza muito mais lentamente. Quanto mais devagar elas se movem, mais retêm ativos de carbono, menos têm a ganhar com políticas adicionais de descarbonização e menos apoiam a ação climática. Esses desenvolvimentos constituirão ventos contrários significativos para uma renovação ambiciosa da política climática, mesmo que o presente senso comum anticlimático se rompa em alguns anos. Todos nós que desejamos ver tal renovação precisamos conceber estratégias que sejam resilientes a esses ventos contrários.

Há, ao mesmo tempo, alguns fatores que podem constituir ventos favoráveis para uma renovação da ação climática. Um breve balanço desses fatores mitigadores pode sugerir alguns caminhos a seguir.

Em primeiro lugar, o custo: Energia limpa é barata. A gasolina está ficando mais cara, especialmente à medida que os EUA redobram seu compromisso com GNL e os fabricantes de turbinas relutam em aumentar a capacidade. Gasolina mais cara significa que energia eólica e especialmente solar são mais atraentes para atender à demanda marginal de energia, especialmente quando combinadas com armazenamento, para o qual os créditos fiscais tecnologicamente neutros sobreviveram. Projetar e vender política climática com forte foco em como ela pode dar respostas ao alto custo de vida é algo que poderia manter ou aumentar o apoio à ação climática. O custo da energia provavelmente também será um ponto problemático para o governo Trump e pode criar aberturas para persuadir seu governo a pelo menos moderar sua política de discriminação desenfreada.

Em segundo lugar, os mercados. Mesmo enquanto a política dos EUA mutila o crescimento dos mercados domésticos para tecnologias limpas, muitas empresas norte-americanas acreditam que seu sucesso a longo prazo depende da capacidade de competir nos mercados de onde se espera que venha a maior parte do crescimento futuro. Nesses mercados, a política não está se voltando contra a energia limpa—e as empresas chinesas parecem bem posicionadas para dominar. Essa realidade provavelmente limitará a extensão em que as montadoras estadunidenses, por exemplo, recuarão dos veículos elétricos.

Em terceiro lugar, as cadeias de suprimentos, cuja vulnerabilidade foi um impulso poderoso para o IRA. Na medida em que os agentes norte-americanos acreditam que as tecnologias limpas têm algum papel a desempenhar na futura matriz energética, provavelmente continuará a haver um impulso para nacionalizar essas cadeias de suprimentos. Qualquer associação entre energia limpa e empregos fabris atenuará os esforços para penalizar a energia limpa e limitará a extensão em que o NSCC se corrói. O fato de que o “45X advanced manufacturing tax credit”1Nota da tradução: programa de crédito para a produção de componentes e minerais críticos usados em equipamentos de energia limpa, que fornece um subsídio por unidade para componentes solares, eólicos e de baterias produzidos domesticamente, bem como minerais críticos. (<)a href='https://www.congress.gov/crs-product/IF12809'(>)Ver mais aqui(<)/a(>) sobreviveu principalmente ao esforço de revogação do IRA é uma forte evidência disso—e a sobrevivência do 45X fornecerá algum alívio à manufatura de tecnologia limpa no futuro previsível.

Em quarto lugar, a “energia limpa firme”. Os créditos fiscais para energia limpa “tecnologicamente neutra” sobreviveram em grande medida para todas as formas de produção que não fossem a solar e a eólica. Se a forte demanda por energia e um enfraquecimento da vantagem de custo da energia solar ajudarem a estimular a demanda por “energia limpa firme”—geotérmica, nuclear, combustíveis fósseis com CCS [Carbon Capture and Storage – Captura e Armazenamento de Carbono]—então talvez vejamos o declínio das emissões e alguns ciclos de retroalimentação positivos para mais ação climática, especialmente se os EUA conseguirem manter uma vantagem tecnológica em pelo menos algumas dessas fontes de energia. Parece haver atividade contínua de startups e apoio de capital de risco para o desenvolvimento de novas tecnologias energéticas. Se existe algum potencial para convocar o atual governo dos EUA como parceiro para produção de energia livre de carbono, ele está aqui.

Em quinto lugar, as próprias mudanças climáticas, que não se importam com qual senso comum está guiando os formuladores de políticas. Eventos climáticos extremos acontecerão com mais frequência e causarão mais danos. A realidade e a probabilidade futura de eventos climáticos extremos impactarão ainda mais os mercados de seguros e, através deles, os preços das casas, impostos sobre propriedade, serviços governamentais locais e orçamentos estaduais (certamente, não podemos simplesmente assumir que vivenciar os efeitos adversos das mudanças climáticas transformará as pessoas em apoiadoras mais fortes da ação climática. Se isso acontece ou não é uma suposição política—que a direita está totalmente preparada para contestar).

Em sexto, a política industrial, cujo retorno não parece estar desaparecendo, embora seus objetivos estejam mudando. O acordo da MP Materials, que fez do Departamento de Defesa (ou da Guerra?) o maior acionista da empresa de terras raras, é uma forte indicação de que o governo dos EUA continuará a utilizar ferramentas de política industrial de maneiras novas e criativas, algumas das quais, talvez, poderiam ser desenvolvidas no futuro.

Por fim, há o próprio Trump, que está sempre quebrando tabus. Com sua ostensiva pressão verbal em torno de tarifas e preços, ele pode muito bem ter contribuído para que houvesse alguma contenção de preços e redução de margens pelas empresas do país. No acordo da MP Materials, e ainda mais notavelmente com a Intel, quebrou normas em torno da propriedade pública. A “ação de ouro” um dia estará em outras mãos, e defensores de uma ação climática agressiva podem ter ferramentas que não acreditavam possuir antes para direcionar os investimentos para os fins desejados.

Mas esses fatores estarão posicionados contra forças centrífugas poderosas que ameaçam fragmentar ainda mais a coalizão. Em particular, aqueles de nós que procuram maneiras de desacelerar e finalmente reverter o ataque da era Trump à ação climática provavelmente encontrarão dilemas que o grande programa fiscal verde nos permitiu adiar em 2021–2022.

Fraturas no NSCC

A perda de subsídios aumentará significativamente a pressão de custos sobre os desenvolvedores de energia solar e eólica e sobre os fabricantes de tecnologia limpa (já que todos estarão competindo por mercados menores e terão perdido disposições legais como os requisitos de montagem e minerais críticos, no caso dos créditos fiscais para veículos limpos, e o bônus de conteúdo doméstico, no caso dos créditos de eletricidade limpa, os quais foram projetados para nivelar o campo de jogo para os produtores dos EUA). A forma final de um novo regime tarifário ainda é completamente desconhecida, assim como seus efeitos sobre os preços domésticos. As tarifas podem fornecer proteção contra a pressão de custos para alguns fabricantes de tecnologias limpas, mas provavelmente pressionar outros.

Diante das pressões de custos, pode-se esperar que as empresas busquem maneiras de reduzir os padrões trabalhistas e limitar a sindicalização, pressionem mais agressivamente por desregulamentação e recuem de compromissos com “benefícios comunitários.” Um setor do capital verde que seja mais implacável, oferecendo menos co-benefícios enquanto investe em descarbonização, aumentará o temor de muitos trabalhadores de que a transição será ruim para a qualidade do emprego, e a preocupação de muitas comunidades de que o desenvolvimento econômico acontece às suas custas. A negociação será mais difícil para produzir unidade entre tal setor e a coalizão social e eleitoral que conquistou os subsídios.

As pressões sobre a rede elétrica causadas por data centers e outras novas fontes de demanda energética já estavam criando tensões para que as metas estatutárias de energia limpa em nível estadual fossem flexibilizadas. A perda de subsídios e regulamentações federais provavelmente exacerbará essas pressões, já que as concessionárias buscam repassar o custo da energia solar e eólica mais caras aos consumidores e as indústrias buscam alívio dos requisitos estaduais de limitação e comércio de emissões. Assim, tendem a emergir conflitos do tipo “economia versus meio ambiente”, com consumidores, operários, beneficiários do Medicaid e outros grupos sendo colocados em oposição aos gastos climáticos, em uma luta por recursos escassos.

O que fazer?

A ação climática caminha para se tornar mais lenta, menos equipada para entregar co-benefícios e mais repleta de dilemas e conflitos distributivos. Cada um desses elementos é uma ameaça e corrói o novo senso comum climático.

Teremos de lidar com a política da escassez. Em tal ambiente, minimizar as divisões dentro da coalizão que forjou o NSCC e ampliar a base de apoio político para a ação climática é imperativo. Mas fazer isso pode significar uma concordância com um ritmo mais lento de ação climática em algumas circunstâncias—o que propõe a tarefa de garantir que um progresso mais lento no curto prazo não se transforme naqueles tipos de comportamento cauteloso que acabarão dificultando uma ação mais ambiciosa no médio prazo. Isso pode significar que temos de buscar foco e eficiência em nossas intervenções políticas. Quais delas geram o maior impacto pelo menor custo? Existem investimentos relacionados ao clima especialmente populares ou politicamente significativos, em torno dos quais a ação de retaguarda pode ser priorizada? Existem oportunidades não apenas para atrair capital, mas para compeli-lo a investir de certas maneiras? Podemos ser mais criativos quanto ao financiamento? Podemos melhorar a maneira de unir a ação climática a outras políticas públicas mais visíveis para as pessoas comuns (por exemplo, habitação)? Que oportunidades existem para ganhar escala, por meio de ações coordenadas entre estados alinhados ao clima? Que tipos de coordenação transnacional podem ajudar a evitar que ciclos de retroalimentação negativos se instalem (já que muitos outros países enfrentam pressões semelhantes)?

É improvável que a comunidade climática se alinhe em torno de uma única resposta para todas essas questões. Mas uma análise compartilhada dos desafios que enfrentamos pode, assim se espera, ajudar a criar uma maior convergência de objetivos. Além do desenho de políticas, parece urgente nos comprometermos novamente com a construção de um movimento como pré-condição para a ação climática. O que as corporações e as elites políticas acreditam ser incentivo não é algo direto, mas é moldado por movimentos. O mundo mudou de muitas maneiras, mas nunca foi maior a necessidade de que as pessoas nos EUA e em todo o mundo se posicionem por um futuro no qual todas as pessoas possam prosperar.

As opiniões aqui apresentadas pertencem exclusivamente ao autor e não representam a BlueGreen Alliance ou seus parceiros.

Tradução: Eduardo Campos Lima

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